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Ordenação de diáconos | Homilia

Ordenações diaconais
 

Ordenação de diáconos | Homilia

 

1. O profeta, o homem sem medo

O profeta Ezequiel (=Deus dá força), com cerca de trinta anos de idade, parte para a Babilónia após a primeira deportação do povo de Israel (592), onde sente o chamamento de Deus. Este chamamento a ser profeta marca a diferença entre os verdadeiros e os falsos profetas. Na Sagrada Escritura, o verdadeiro profeta é o que recebe o Espírito do Senhor, tal como nos lembra a vocação dos profetas Jeremias e Isaías: – «Antes de te haver formado no ventre materno, Eu já te conhecia» (Jer 1,5); «Então, ouvi a voz do Senhor que dizia: Quem enviarei? Quem será o nosso mensageiro? Então eu disse: eis-me aqui, envia-me» (Is 6,8).

Este chamamento é uma experiência que parte em mil pedaços a vida de uma pessoa, porque o verdadeiro profeta não fala por falar, mas é a força do Espírito de Deus que o lança a ir mais longe, a tornar cada vez mais viva a Palavra do Senhor.

 

2. A força na fraqueza

O texto da segunda carta de S. Paulo aos coríntios é talvez uma das confissões mais humanas do apóstolo e que nos ajuda a crescer numa confiança cada vez maior em Deus presente na nossa vida.

Por isso, devemos todos escutar e guardar no coração, particularmente, vós os ordinandos: – «Basta-te a minha graça, porque a força manifesta-se na fraqueza» (2Cor 12,9). A graça torna o apóstolo forte nas dificuldades e leva-o a aceitar-se tal como é e a viver o projeto que Deus tem para ele. O Deus da cruz, que é o Deus da incarnação, é o único Deus que merece que nos entreguemos e confiemos n’Ele. Aqui reside a força do apóstolo e também a força da missão a que fomos chamados.

 

3. Jesus chama porque nos ama

Depois de ter percorrido a Galileia pregando o Evangelho, Jesus vai à sua terra, Nazaré, onde não é reconhecido e até perguntam: – «Donde lhe vem tudo isto e que sabedoria é esta que Lhe foi dada»?

A sabedoria de Deus não se aprende, não se ensina, vive-se e transmite-se como experiência de vida. A autoridade de Jesus, tal como a autoridade que nos é conferida pelo sacramento da Ordem, reconhece-se naqueles que têm o Espírito de Deus. Jesus continua a ser o filho do carpinteiro e de Maria, mas tem o Espírito dos profetas. Os profetas, tal como cada um de nós, são chamados entre o povo simples, arrancados das suas casas, do seu trabalho; a sua vida tem um novo sentido, de tal forma que, às vezes, aqueles que nos são mais próximos nem se dão conta de que o Senhor passou pelas nossas vidas e nós não podemos deixar de O seguir.

Vivemos tempos difíceis no anúncio do Evangelho e na proposta que todos somos chamados a fazer em ordem à revitalização das nossas comunidades cristãs. Importa desenvolver uma cultura vocacional onde todos nos sintamos corresponsáveis, porque o futuro da fé deve preocupar não apenas os sacerdotes e os religiosos, mas todo o povo de Deus. Esta cultura vocacional, como afirma o Instrumento de Trabalho do próximo Sínodo dos bispos sobre Os jovens, a fé e o discernimento vocacional, deve estar «sempre relacionada com a alegria da comunhão de amor que gera vida e esperança. A plenitude da alegria, de facto, só pode ser experimentada após a descoberta do que é ser amado e, por esta razão, sermos nós chamados a amar» (nº 90).

 

Queridos Jorge Manuel, Pedro Rafael e Frei João Carlos:

Não estais sozinhos. Jesus chama-vos porque vos ama e escolheu-vos para estardes com Ele. O chamamento não supõe nenhuma qualidade especial ou mérito nos escolhidos, porque a iniciativa é totalmente de Jesus. Escolhe os seus apóstolos de entre a multidão para estarem com Ele, para O acompanharem e para os tornar participantes do projeto do Pai para a humanidade: a construção do Reino de Deus. Os discípulos prolongam a missão de Jesus e a sua pregação fundamental será a de dar testemunho do que viram e ouviram, e para isso é necessário que estejam com Ele. Anunciar o Reino é anunciar a pessoa de Jesus como iniciador do mesmo Reino. Não pode ir pregar quem não esteve previamente com Jesus.

A vossa ordenação de diáconos em ordem ao sacerdócio é uma graça que o Senhor concede à nossa Diocese de Aveiro e à Ordem dos Carmelitas Descalços. O Papa Francisco na sua última Exortação Apostólica sobre o chamamento à santidade diz-nos: – «Quando perscrutamos na presença de Deus os caminhos da vida, não há espaços que fiquem excluídos. Em todos os aspetos da existência, podemos continuar a crescer e dar algo mais a Deus, mesmo naqueles em que experimentamos as dificuldades mais fortes. Mas é necessário pedir ao Espírito Santo que nos liberte e expulse aquele medo que nos leva a negar-Lhe a entrada nalguns aspetos da nossa vida. Aquele que pede tudo, também dá tudo, e não quer entrar em nós para mutilar ou enfraquecer, mas para levar à perfeição» (G et Ex 175).

 

Termino com uma oração, da autoria de S. teresa de Jesus, bem conhecida do nosso frei João Carlos e que proponho também ao Jorge e ao Pedro para a missão a que o Senhor vos chama. Convido, também, cada um dos presentes a fazer sua esta oração.

Aveiro (Catedral), 8/9/2018.

+ António Manuel Moiteiro Ramos, Bispo de Aveiro.


 

Vossa sou, para Vós nasci,
Que quereis, Senhor, de mim?

Vossa sou, pois me criastes,
Vossa, pois me redimistes,
Vossa, pois me sofrestes,
Vossa, pois me chamastes,
Vossa, pois me esperastes,
Vossa, pois não me perdi,
Que quereis, Senhor, de mim?

Eis aqui meu coração,
eu o ponho em Vossas mãos,
meu corpo, a vida, a alma,
O meu íntimo e afeição
Doce esposo e redenção,
Pois por Vós eu me ofereci:
Que quereis, Senhor, de mim?

Dai-me a morte, dai-me a vida,
dai-me saúde ou doença
dai-me honra ou desonra
dai-me guerra ou paz sentida,
fraqueza ou força vivida,
que a tudo digo sim:
Que quereis, Senhor, de mim?

Se quereis que esteja folgando,
Quero por amor folgar.
Se me mandais trabalhar,
Quero morrer trabalhando.
Dizei: onde, como e quando?
Dizei, doce amor e repeti:
Que quereis, Senhor, de mim?

Esteja calado ou falando,
Faça fruto, ou não o faça,
Mostre a lei a minha chaga,
Goze do Evangelho santo;
Esteja penando ou gozando,
Só Vós em mim vivei:
Que quereis, Senhor, de mim?

Vosso sou, para Vós nasci,
Que quereis, Senhor, de mim?

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