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Dia da Igreja Diocesana – Homilia

foto: Correio do Vouga

1 – Não tenhais medo

O capítulo décimo de S. Mateus constitui, no conjunto do seu Evangelho, a secção narrativa que fala dos ensinamentos que Jesus dá aos seus discípulos, para que eles sejam os missionários do Reino que o Pai lhe tinha confiado. No domingo passado Jesus ao contemplar a multidão “encheu-se de compaixão por ela, pois estava cansada e abatida, como ovelhas sem pastor” (v. 36) e hoje, perante as dificuldades que o anúncio do Reino traz consigo, dirá “não tenhais medo, Eu estou convosco”. No próximo domingo pede a conformidade de vida que deve reinar entre o discípulo e o Mestre.

«Não tenhais medo dos homens, pois nada há encoberto que não venha a descobrir-se, nada há oculto que não venha a conhecer-se». O desafio a vencer o medo vem sempre de Deus para animar o seu povo. Aqui é Jesus quem anima os seus discípulos para lhes mostrar que nada pode impedir que se faça o anúncio do Reino. É o próprio Deus quem garante o êxito, porque ele é o dono da seara, mas os discípulos não podem deixar de realizar a sua parte na missão. Daí o chamamento à confiança vencendo o medo.

O Reino e o seu poder não se traduzem em formas de domínio sobre o mundo, mas em debilidade perante os homens: por parte dos judeus (sinédrio e sinagoga) e por parte dos pagãos (governadores e reis). A mesma atitude de vida do mensageiro serve já de testemunho. Não precisa de falar. Não tem que se defender. Exteriormente afundado, conta com a força do Espírito de Deus. Esta é a sua certeza e esta é a sua vitória.

A confiança, fundada na bondade de Deus para com as aves do céu, leva os discípulos a não se preocuparem com o que hão de comer, beber ou vestir, concluindo que “o Pai do Céu bem sabe do que precisais”.

A confiança vem da certeza de que todas as coisas estão nas mãos de Deus, que na sua bondade ele tudo controla, “até os cabelos da nossa cabeça”. Jesus pede aos discípulos a atitude de quem dá testemunho, confessando Cristo diante dos homens, ou a atitude de negar Jesus diante dos homens, assumindo as responsabilidades dessa opção.

As palavras de Jeremias exprimem os seus sentimentos mais profundos, vividos em situações complexas e difíceis, de perseguição, que colocam o profeta entre a ameaça dos inimigos e a confiança em Deus, entre a consolação por saber que sofre por causa de Deus e a incapacidade humana de aguentar a dor causada por tanta humilhação e sofrimento.

2 – A realidade que nos rodeia

Vivemos tempos que nos desafiam e reconhecemos que o grito do profeta Jeremias é também o nosso. A nossa síntese diocesana do Sínodo dos Bispos refere que a Igreja, na sua relação com o mundo e cultura atuais, enfrenta grandes desafios e reclama-se um outro modo de presença, onde se acolhe e se escuta, sintetizando, deste modo, a nossa realidade a partir dos grupos sinodais:

1º A Igreja tem dificuldade em perceber e aceitar a cultura atual (do instante e do provisório). Por isso não sabe situar-se profeticamente, nem é capaz de comunicar a sua mensagem. O mundo mudou, a Igreja ainda não entendeu isso.

2º O grande desafio é, pois, testemunhar a alegria e a vontade em viver os desafios do Evangelho num mundo que não se conhece e numa cultura que não se compreende.

3º A Igreja é vista de fora (e também internamente, por muitos leigos comprometidos) como tendo muita dificuldade em integrar as diferenças.

3ºA Igreja está, progressivamente, a perder relevância porque não olha com bondade para o mundo e para as pessoas. O acolhimento é visto como “o ficar à espera, os que não estão cá, os que não participam que venham, nós acolhemos!”

Há um imenso trabalho a empreender em ordem a uma efetiva renovação da pastoral da Igreja, mas não podemos ficar à espera de que Deus faça tudo por nós. Como membros deste Corpo que é a Igreja Diocesana, somos mais perfeitos quanto mais nos abrirmos ao dom de Deus e nos aproximarmos uns dos outros. Os acontecimentos devem ser acolhidos como oportunidade de martyría (Lc 21,13), de testemunho.

3 – Desafios a alcançar

Estamos a celebrar o dia da Igreja Diocesana e destacamos na nossa celebração os membros dos Conselhos Pastorais e Económicos, os jovens que participam na JMJ, as muitas famílias que vão acolher os jovens que vão estar connosco nos “Dias das Dioceses” e os voluntários que irão em missão.

Desejo referir dois campos de ação nos quais nos devemos empenhar para que aconteça a mudança e a conversão de cada um de nós e das nossas comunidades cristãs.

1º Evangelizar pelo testemunho.

O testemunho de uma vida unida a Jesus não só nos estimula a viver uma vida melhor e mais bela, como nos leva a anunciar aos outros esse amor. «O valor do testemunho não significa que se deva calar a palavra. Porque não falar de Jesus, porque não contar aos outros que Ele nos dá forças para viver, que é bom conversar com Ele, que nos faz bem meditar as suas Palavras» (ChV 176). Oxalá que todos possamos sentir no coração o mesmo impulso que movia S. Paulo, quando dizia: Ai de mim se eu não anunciar o Evangelho (1Cor 9,16).

2º Uma cultura de encontro e comunhão.

Somos desafiados a desenvolver na nossa Diocese e na sociedade portuguesa o ícone evangélico da Visitação de Nossa Senhora a sua prima Isabel que se concretiza num encontro geracional entre uma jovem e uma anciã. Comentado esta passagem bíblica, o Papa Francisco escreveu: «Maria encontra Isabel, já de idade avançada. Mas é ela, a idosa, que fala de futuro, que profetiza: “cheia do Espírito Santo”, proclama Maria “feliz” porque acreditou, antecipando a última bem-aventurança dos Evangelhos: “felizes os que creem”. E assim a jovem vai ao encontro da idosa procurando as raízes, e a idosa renasce e profetiza acerca da jovem, dando-lhe futuro. Assim se encontram jovens e anciãos, abraçam-se e cada um é capaz de despertar o melhor do outro. É o milagre suscitado pela cultura do encontro, na qual ninguém é descartado nem rotulado; antes pelo contrário, todos são procurados, porque necessários para fazer transparecer o rosto do senhor. Não têm medo de caminhar juntos e, quando isto acontece, Deus chega e realiza prodígios no seu povo» (Roménia, 31 maio de 2019).

A Santa Maria de Vagos confio a nossa Diocese e cada um de nós na esperança de perseverar na alegria do serviço ao Reino de Deus. Com Jesus no meio de nós não temos medo de caminhar e renovar a nossa Igreja Diocesana.

Senhor Jesus, Bom Pastor,

nós te agradecemos a Igreja que somos,

com as suas luzes, as suas sombras,

e o desejo de fidelidade ao Evangelho.

Ensina-nos

a ver os sinais da tua presença.

Ajuda-nos

a viver o amor e a comunhão, marca da tua Igreja.

Faz-nos sentir a necessidade de edificar a Igreja pela oração,

Pelo encontro e pela partilha de bens,

para construir a nossa Igreja de Aveiro sobre rocha firme.

Acende no nosso coração um zelo ardente que nos entusiasme a anunciar a Boa Nova a todos.

Amen.

Santuário de Nossa Senhora de Vagos, 25 de junho de 2023.

+ António Manuel Moiteiro Ramos, Bispo de Aveiro


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